Pndh III e a luta pelos direitos humanos no Brasil

25 01 2010

Por Fazendo Media

A ABONG – Associação Brasileira de Organizações Não Governamentais, o FENDH – Fórum de Entidades Nacionais de Direitos Humanos, o MNDH – Movimento Nacional de Direitos Humanos e a Plataforma Dhesca Brasil – Plataforma Brasileira de Direitos Humanos Econômicos Sociais, Culturais e Ambientais, que reúnem centenas de organizações e movimentos sociais em todo o Brasil, manifestam, por meio desta nota, seu apoio ao III Programa Nacional de Direitos Humanos que, desde sua publicação, tem causado forte reação contrária de setores conservadores da sociedade brasileira.

Formulado de maneira transparente, dentro de um processo que envolveu grande participação popular, consultas públicas e conferências municipais, estaduais e nacional, com a presença de 14.000 representantes do poder público e da sociedade civil, o PNDH III caminha no sentido da efetivação de uma política real de Direitos Humanos, fundamental para a construção de um país democrático para todos e todas. Assim, é imprescindível tocar em questões como a democratização da propriedade e dos meios de comunicação e a abertura dos arquivos da ditadura militar (1964-1985). O Programa é pioneiro ao discutir a relação entre modelo de desenvolvimento e Direitos Humanos, afirmando também a impossibilidade de efetivar os direitos no Brasil se não forem combatidas as desigualdades de renda, raça/etnia e gênero e a violência nos centros urbanos e no campo.

Infelizmente, a ofensiva levada a cabo por setores da imprensa e de alas conservadoras da Igreja, militares e ruralistas, entre outros, tenta disseminar uma visão anacrônica dos direitos humanos, reagindo violentamente a qualquer tentativa de mudança deste quadro no país. O debate sobre o PNDH III tem sido sistematicamente tolhido pelos meios de comunicação comerciais, que dão voz a apenas um lado, reforçando os argumentos que apontam para a necessidade de construção de uma mídia plural e democrática. Se esquecem, contudo, de colocar que a elaboração do PNDH é um compromisso internacional assumido pelo Brasil em 1993, na Conferência de Viena, que recomendou em seu plano de ação que os países elaborassem Programas Nacionais de Direitos Humanos, por meio dos quais os Estados avançariam na promoção e proteção dos direitos.

Neste sentido, o Programa dá um passo adiante em relação ao que existe desde o governo FHC (PNDH I – 1996 e PNDH II – 2002), e concretiza o que já está ratificado nos inúmeros Tratados Internacionais que o Brasil assina no âmbito das Nações Unidas e do Sistema Interamericano de Direitos Humanos.

A ABONG, o FENDH, o MNDH e a Plataforma Dhesca chamam a atenção para a necessidade de avançarmos na proposição e efetivação de políticas públicas ligadas aos Direitos Humanos como pressuposto para a construção da sociedade que queremos. Acreditamos que o Programa Nacional de Direitos Humanos representa esse passo necessário e urgente de garantir uma vida com dignidade para todos(as) os(as) brasileiros(as).

Brasília, 12 de janeiro de 2010.

ABONG – Associação Brasileira de Organizações Não Governamentais
www.abong.org.br

FENDH – Fórum Nacional de Entidade de Direitos Humanos
www.direitos.org.br

MNDH – Movimento Nacional de Direitos Humanos
www.mndh.org.br

Plataforma Dhesca Brasil – Plataforma Brasileira de Direitos Humanos Econômicos Sociais, Culturais e Ambientais
www.dhescbrasil.org.br

(*) Carta aberta publicada originalmente na Plataforma Dhesca Brasil.





“Direita” raivosa?

21 01 2010

Nas últimas semanas, tem se discutido muito acerca do Programa Nacional de Direitos Humanos. A mídia grande, assim como em 64 em que apoiou o golpe militar, comprou a briga do ministro da defesa Nelson Jobim que achou “injustiça” o capítulo do projeto que prevê a punição para os militares.

Os últimos acontecimentos mostram uma verdade escondida pela grande mídia: os militares, as elites econômicas em sua maioria são contra os direitos humanos dos militantes de esquerda, dos pobres, dos negros, dos favelados, dos gays etc. Na última sexta-feira, dia 15 de janeiro, numa homenagem aos combatentes da esquerda que morreram torturados, assassinados sem julgamento, houve uma ameaça de bomba, que, ao que tudo indica, pode ter sido implantada por militares raivosos com a celebração de grandes lutadores por um mundo justo e igualitário. Não há nenhuma prova de que a ameaça tenha sido feita por militares, mas não podemos apagar da história brasileira, capítulos sangrantos como os anos de terror contra quem buscava justiça social e lutava contra o regime autoritário nos anos de chumbo.

A ameaça de bomba não pode ser utilizada como mais uma das provas de que os militares querem (como demonstra a charge de Latuff) apagar, na marra, a história de terror cometido por eles, mas nos traz a lembrança de que ainda vivemos num mundo em que os direitos humanos existem para poucos. Para comprovar este fato, basta visitar uma favela, no Rio de Janeiro, por exemplo, e perguntar aos moradores se os direitos humanos deles são garantidos, se não sofrem abusos por parte de polícia e varejistas de droga, com extorsão, execução sumária, tortura, invasão de domicílio entre outros. Só um lembrete: para comprovar isso, é necessário despir-se do preconceito construído, com a ajuda da mídia grande, diga-se de passagem, contra o povo favelado. Apagar a história e anistiar o horror é permitir que o desrespeito contra a dignidade humana continue impune.

A reportagem sobre a ameaça de bomba é da Agência Petroleira de Notícias, leia abaixo:

Ameaça de bomba no Centro Cultural da Caixa

Por Agência Petroleira de Notícias, 18-01-10

Durante homenagem a Carlos Mariguella, Mário Alves, Maurício Grabois, Sonia Angel e a outros combatentes desaparecidos na ditadura militar, houve uma ameaça de bomba que obrigou todos os que estavam na sede do Centro Cultural da Caixa, no centro do Rio de Janeiro, a evacuarem o prédio. A atividade acontecia na noite de 15 de janeiro, sexta-feira. O prédio foi evacuado antes das 22 horas, quando se encerraria o debate, seguido da entrega de diplomas aos familiares dos mortos/desaparecidos, depois da apresentação do documentário sobre Mariguella.

Essa é a noção de direitos humanos dos militares e das elites. Charge por Carlos Latuff

O evento foi organizado pelos grupos Tortura Nunca Mais/RJ, Marighella Vive e Exposição Marighella. O ato teve início com a exibição do filme do Sylvio Tendeler sobre Marighella. Após o filme, o debate chegou a acontecer.  No momento em que as homenagens aos que tombaram à época da ditadura deveriam começar, chegou a ordem para que todos deixarem o recinto, (eram mais de 100 pessoas), porque a administração do prédio recebeu um comunicado de que haviam colocado uma bomba no local.

Os diplomas foram entregues aos familiares de alguns dos mortos/desaparecidos: Sônia (neta de Cléia Moraes) recebeu em nome da família a homenagem à Sônia Moraes Angel Jones; Zilda Xavier, em nome de seus filhos Yuri e Alex Xavier; Ana Müller representou a família de Mário Alves; Victória Grabois, por seu pai Maurício Grabois, seu irmão André Grabois e seu marido Gilberto Olímpio.





Direitos Humanos: porque nossa idiotice não tem limites

16 01 2010

Por Leonardo Sakamoto

Bandido bom é bandido morto… Tinha que ser preto mesmo!… Baiano quando não faz na entrada faz na saída… Mulher no volante, perigo constante… Sabe quando pobre toma laranjada? Quando rola briga na feira.

– Amor, fecha rápido o vidro que tá vindo um escurinho mal encarado.
– Aquilo são ciganos? Vai, atravessa a rua para não dar de cara com eles!
– Não sou preconceituoso. Eu tenho amigos gays.
– Tá vendo? É por isso que um tipo como esse continua sendo lixeiro.
– Por favor, subscreva o abaixo-assinado. É para tirar esse terreiro de macumba de nossa rua.

Os sem-terra são todos vagabundos que querem roubar o que os outros conquistaram com muito suor.
A política de cotas raciais é um preconceito às avessas.
Os índios são pessoas indolentes. Erra o governo ao mantê-los naquele estado de selvageria.
As rádios comunitárias são um crime. Derrubam até aviões.
Tortura deve continuar sendo um método válido de interrogatório.

– Uma puta! Alguém pega o extintor para jogar nessas vadias.
– Um índio! Alguém pega gasolina para a gente atear fogos nesses vagabundos.
– Um mendigo! Alguém pega um pau para a gente dar um cacete nesses sujos.

E, no Brasil, tem gente que não entende a razão de um programa de direitos humanos ter que ser amplo. Porque a nossa idiotice não tem limites.





DIREITOS HUMANOS: INTERESSES PRIVADOS CONTRA POLÍTICAS PÚBLICAS

14 01 2010

Por Marcelo Salles, do Fazendo Media

Já são 20 dias de intenso bombardeio contra o Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH-3). Ontem o Jornal da Band (veja artigo do Azenha), apresentado por Bóris CCCasoy (veja reprodução da reportagem da revista cruzeiro de 68 sobre o CCC- Comando de Caça aos Comunistas), levou ao ar uma pseudo-reportagem. O texto fala que o decreto do PNDH-3 é criticado por “especialistas”, mas usa uma única fonte – o insuspeito Ives Gandra Martins. E não diz que o Programa foi assinado por nada menos que 31 ministérios. A Band chama de autoritário um texto que propõe, recomenda, apóia, fomenta. E diz ser autoritária uma proposta concluída após dezenas de conferências, ou seja, chancelada por intensa participação popular. Além disso, a Band afirma erroneamente que o PNDH-3 é uma lei, um erro crasso, já que só quem poderá transformar o Programa em lei é o Congresso Nacional. As demais corporações de mídia, umas mais, outras menos, seguem pelo mesmo caminho. O Jornal Nacional, por exemplo, voltou a insistir na tese de que o PNDH-3 quer a revisão da Lei de Anistia, apesar de toda a imprensa nacional já ter sido avisada pela Secretaria Especial de Direitos Humanos de que isto não é verdade. E quem pegar para ler o programa vai constatar: não há nenhuma menção à revisão da Lei de Anistia.

Contra a campanha de políticas PÚBLICAS de Direitos Humanos estão os interesses PRIVADOS de latifundiários e oligopólios de mídia, além de preconceitos medievais contra os setores LGBTs, praticantes de religiões afro-descendentes e as mulheres. Há também os interesses particulares de quem seqüestrou, torturou e assassinou durante a ditadura de 1964.

Ao fim e ao cabo, o presidente da República é quem vai decidir sobre a redação final do texto, fazendo os ajustes que achar melhor. E o governo vai seguir adiante. Quanto as corporações de mídia, aconteça o que acontecer, é possível dizer que nenhum ajuste será suficiente para recuperar a credibilidade perdida – o que, no caso, ficou evidente com a predileção editorial pela peruca da Dilma em detrimento do PNDH-3 em si, no dia de seu lançamento.





O chargista Latuff e o Programa Nacional de Direitos Humanos

11 01 2010

Texto e Ilustração por Carlos Latuff

Com todo esse burburinho sobre a revisão da Lei de Anistia prevista no Programa Nacional de Direitos Humanos, um discurso tem sido frequente. Que se deva apurar os crimes cometidos de ambos os lados durante o regime militar, tanto dos militantes de esquerda quanto das forças de repressão.

O que a primeira vista pode parecer uma posição de aparente equilíbrio, traz na verdade um conceito reacionário, de que a resistência armada a um regime de exceção seja vista como crime (criminalização).

Não nos esqueçamos de que os militantes de esquerda que lutaram contra a ditadura militar no Brasil já tiveram punição suficiente. Foram presos, cassados, implacavelmente torturados, executados, desaparecidos. Já seus carrascos, sem nenhum arranhão, escaparam tranquilos da Justiça, indo se refugiar nos braços da Lei de Anistia, inclusive reverenciados pelos seus atuais colegas de farda nos clubes militares da vida.

Levar ao banco dos réus ex-militantes que pegaram em armas para enfrentar fascistas no Brasil seria tão absurdo quanto julgar os partisans pelos atentados cometidos contra militares alemães durante a ocupação da França na Segunda Guerra Mundial. É confundir, maliciosamente, vítimas com algozes…mais uma vez.

Por isso, meus caros internautas, eu lhes trago este checklist, para que possam imprimir em papel cartão, num tamanho que caiba no bolso ou dentro da carteira. Quando o assunto for revisão da Lei de Anistia e alguém lhe disser que “ambos os lados devam ser punidos”, mostre essa charge, só como um lembrete de mais essa verdade inconveniente.